domingo, 3 de maio de 2020

No Cantinho do Céu não tinha Ayrton Senna da Silva

Esse texto é dedicado ao Bado, meu irmão querido.


Bado, que nos nos deixou no dia 9/6/2023




Dia 3 de junho de 1984. Morávamos eu, Bado e Cascão numa casinha simpática numa rua de terra num bairro de Viçosa chamado Cantinho do Céu, que dada a feiúra apelidamos de Beirolinha do Inferno.

Domingão dia de Fórmula 1. Normalmente a gente teria ido pra BH, principalmente o Bado, que não ficava quase fim de semana nenhum em Viçosa. Por alguma razão que me escapa, ficamos. Acordamos naquela ressaca domingueira, ligamos a TV e... nada!!!

A TV simplesmente chiava, fora do ar. Nos afligimos, afinal de contas era Mônaco, né? Saimos de casa pra tentar entender se o problema era só lá e demos de cara com o Chiquinho, amigo e colega de trabalho na carpintaria da Universidade onde eu e o Bado dávamos expediente.

Criador de curiós e morador do morro em frente, o Chico passeava com um de seus passarinhos. Fazia isso com o braço esticado e a gaiola na palma da mão, de olho no bicho e se deliciando com seu canto.

Também ele fã de Fórmula 1, veio confirmar se o problema rolava também em casa. Diante da confirmação, bateu o desespero, mais nele e no Bado que eram bem mais fãs que eu.

Aqui começava nossa saga.

O Chico disse que tinha um amigo que morava por ali que era o técnico responsável pelo posicionamento das antenas de recepção de sinal do satélite para distribuição pela cidade. Pegamos as bicicletas e corremos até a casa do cabra. Lá chegando demos com a cara na porta, mas uma vizinha nos deu a dica: o cara era membro da Igreja Presbiteriana, e devia estar no culto da Primeira Igreja a aquela hora.

O Bado e o Chico resolveram então que devíamos ir lá e tentar convencer o cabra a resolver a questão.

A Primeira Igreja Presbiteriana de Viçosa ficava na P. H Rolfs, "avenida" que dava acesso ao portão principal da UFV e era longe pra cacete de casa. Toca a pedalar e rápido (tava chegando a hora da corrida). Lá chegando o Chico, que conhecia o cara, entrou na Igreja (que tem bem uns 500 lugares) no meio do culto, achou o cara e o levou pra onde a gente tava, do lado de fora.

O sujeito então nos explicou que estava acontecendo um procedimento de ajuste na antena que seria interrompido só à tarde, ou seja, em Viçosa não ia rolar de ver a corrida. Tentamos convencê-lo a interromper o tal procedimento, o que obviamente ele se recusou a fazer. Mas nos deu uma dica: em Silvestre, um bairro bem pra lá lá de casa talvez fosse possível assistir a corrida, já que o sinal de Ponte Nova chegava até lá, a depender do lugar.

O Chico então se lembrou de um outro amigo que tinha carro e era também tarado por F1. Toca a pedalar até a casa do cara, acordá-lo e convencê-lo a ir tentar ver a corrida em Silvestre nos levando junto.

Só tinha um problema: o carro do cara tava quase sem gasolina e posto nessa época não abria domingo.

Convencemos o sujeito a pelo menos tentar. Se lá chegássemos, na volta daríamos um jeito.

Entramos no carro e fomos de voada a Silvestre. Lá chegando... e agora, onde assistir a corrida? Não conhecíamos ninguém que morava lá...

Saímos procurando pela cidade e de repente ouvimos o som da chamada da corrida dentro do que parecia a porta de um botequim ainda fechado.

Batemos, o cabra abriu, contamos nosso drama e ele, que iria abrir o bar só pro almoço, topou nos receber pra assistir a corrida.

Sentamo-nos então em frente a uma TV bem velha, P&B, bem na hora da largada!

O resto... bom o resto é História!